Por Verônica Roger
CRP 05/20049
CRP 05/20049
A temática deste artigo surgiu a partir da minha experiência clínica e de discussões que são fundamentais para se pensar certas questões sobre o autismo e sua abordagem clínica. A partir do quadro descritivo que apresenta um diagnóstico de autismo, o que poderíamos dizer da criança que nos é encaminhada para tratamento e como este tratamento poderia se dar?
O psiquiatra Leo Kanner foi o primeiro a descrever, em 1943, determinadas crianças dentro da categoria a que denominou autismo. Ele coloca que o autista, desde o início, desdenha, ignora e exclui o que lhe vem de fora e que esta é uma patologia em que há uma incapacidade da criança em estabelecer, precocemente, relações e reagir normalmente às pessoas e situações.
É comum também, ouvirmos falar que o autismo é uma patologia da subjetivação. Será que a rigor, todas as patologias não diriam respeito à subjetivação? Toda criança já nasce sujeito ou ela nasce um pedaço de carne e se torna um sujeito? Ao que estamos nos referindo quando falamos em subjetivação, em sujeito?
A criança, ao vir ao mundo, não está pronta e não sobrevive sozinha. É necessário uma outra pessoa que garanta sua sobrevivência e, a partir desta relação, ela poderá se constituir como sujeito. Será então, que o paciente autista é oco? Ou será que a presença do não-ser pode ser considerado algo?
Em Melanie Klein, partimos do pressuposto de um ego já existente, embora incipiente. Com a posição autista-contígua, podemos pensar no momento fundador da possibilidade de dentro e fora, de poder conter e expelir, o momento originário da pele-envelope que vai permitir, ao mesmo tempo, a troca e o isolamento, a intrusão e o evitamento. Estas são as condições mínimas para podermos nos lançar nas trilhas da subjetivação.
Se o material trazido por cada paciente, independente da patologia que apresente, é singular e se o tratamento deste material também o é, com o paciente autista isto se agudiza. A cada momento, as hipóteses vão se construindo e se modificando, com se estivéssemos construindo um edifício cuja construção não seguiria nenhum tipo de projeto estabelecido. Um projeto que se aperfeiçoa momento a momento, de uma forma mais intensa do que com qualquer outro tipo de paciente.
No tratamento com o paciente autista, onde ninguém consegue ver coisa alguma, é preciso insistir em ver uma criança. É preciso ver algo que “ainda não é”, como “já sendo”.
A “aposta antecipatória” do analista impõe a opção pela presença do sujeito e de que o tratamento não exclui a responsabilidade ética que vai fazer com que o encontro entre opsicanalista e o paciente possibilite o caminhar possível em busca de um lugar para o sujeito autista no mundo.
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